sábado, 10 de março de 2012

ELIS REGINA & ADONIRAN BARBOSA - TIRO AO ÁLVARO

sexta-feira, 9 de março de 2012

FICHA LIMPA: RENO XIMENES, PROCURADOR DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO CEARÁ, ESCLARECE PARECER

Sobre críticas feitas pelo deputado estadual Ely Aguiar (PRTB) ao seu parecer contrário à emenda que quer instituir a Ficha Limpa nos cargos estaduais, proposta do pedetista Heitor Férrer, o procurador jurídico do Poder Legislativo, Reno Ximenes, manda a seguinte nota para o Blog. Confira:

Caro Eliomar de Lima,

Gostaria de prestar os seguintes esclarecimentos a respeito da polêmica criada em torno da Ficha Limpa no Estado:

1. Parecer jurídico é um exercício profissional que goza de imunidade profissional baseado no art. 133 da Constituição Federal, servindo apenas como orientação jurídica às condutas jurisdicionais, executivas ou legislativas, como é o caso concreto, podendo, serem discricionariamente ou politicamente despercebidos pelos gestores ou mandatários. Acerca da manutenção ou retratação de uma convicção jurídica, cabe exclusivamente, ao parecerista ou o responsável pelo ó rgão jurídico a sua condução, expedição ou retratação, não ficando suscetível ao tempo e espaço de ritos, principalmente, quando ocorre um fato novo, como foi a decisão do STF, emitida após o parecer exarado por mim e antes da decisão do plenário da assembléia. Parecer que mantenho pelos seguintes argumentos principais:

2. A matéria do “ficha limpa” para os Estados não pode ser copiada automaticamente, nos termos da decisão do STF. Embora não tenha efeito vinculante aos Estados, o que STF decidiu é afeto apenas aos casos de elegibilidade de candidaturas em matéria de Direito Eleitoral. Casos de investidura e exercício de servidores públicos são da área do Direito Administrativo, matéria diversa da tratada no Supremo.

3. Há controvérsias do teor da matéria e a Constituição Federal veda aos Estados legislarem sobre Direito Penal e Processual, competência privativa da União.

4. Mesmo que sobrevivesse algum argumento de cunho moral, o projeto está contaminado de vício de iniciativa, pois projetos de lei que tratem de gestão administrativa e servidores públicos, o próprio Supremo Tribunal Federal sustenta que é de competência privativa do Poder Executivo, cabendo a ele exclusivamente a faculdade de deflagrar o processo legislativo.

5. A decisão do STF é inconstitucional, como outras recentes que tem retirado direitos constitucionais pétreos, pois a Constituição Federal foi escrita por uma assembleia nacional constituinte eleita exclusivamente para tal fim, não cabendo ao STF poderes para revogar os direitos historicamente consagrados nela consignados, nem mesmo através de emenda constitucional, em razão da vedação do Art. 60.

6. As críticas políticas ao parecer fazem parte do exercício justo do cotidiano parlamentar ou da sociedade, o que não cabe a mim replicar, apenas quando elas surgirem com algum teor, substancialmente, jurídico.

7. A aprovação por outros Estados ou Municípios são decisões políticas, não necessariamente jurídicas ou constitucionais, movidas pelo torpor do moralismo, pois ainda não foram aferidas a sua constitucionalidade, o que necessariamente, apenas o futuro dirá.

8. Só falta o populismo jurídico aparecer agora com uma proposta para extinguir com o Habeas Corpus, sob o pretexto que esteja trazendo à liberdade, indevidamente, muitas pessoas.

9. Não se pode fazer reformas políticas com decisões judiciais baseadas em retóricas jurídicas. Para a probidade administrativa e eleitoral o país já possui inúmeras leis que são cotidianamente descumpridas, suspensas ou despercebidas. O que falta é postura e força política no combate à impunidade, principalmente no Brasil, em face do Direito Eleitoral ser eminentemente jurisprudencial, portanto, vulnerável e inseguro juridicamente.

10. Sou solidário à indignação social em face de muitos desmandos públicos, mas, garanto que não é construindo falsos horizontes jurídicos baseado no moralismo messiânico que resolveremos. Moralismo não é moralidade. Moralismo é apenas um bâlsamo que atenua a dor e o sintoma iludindo a doença, no caso, aquela que a sociedade brasileira hoje sofre, a desonestidade pública e a canalhice populista, fazendo retardar as atitudes efetivamente necessárias para uma reforma política inadiável.


* Reno Ximenes, Procurador Jurídico do Poder Legislativo do Ceará.

(No blog do Eliomar de Lima)

quinta-feira, 8 de março de 2012

MUI MULHER

Não sou de medir palavras

Não sou mulher recatada

O que serve para sua

Não serve pra minha estrada

Sou mulher de atitude

E nem sei se isto é virtude

Ou insolência dobrada.

*

Enfrento qualquer encrenca

Seja aqui ou no sertão

Já tive que puxar faca

Numa certa ocasião

Quando puxei a peixeira

Eu vi pegar na carreira

Quem armou tal confusão

*

Onde você estudou,

Não pude ser educada,

Pois tive que botar cedo

O meu pezinho na estrada,

Mas na escola da vida

Não virei uma perdida

Garanto, sou graduada.

*

Se quiser me enfrentar

Va prestando atenção

Não fujo de uma peleja

Sou mulher de opinião.

Gosto de diplomacia

Mas numa delegacia

Tenho argumentação.

*

Se quiser ganhar no grito

Alto também sei gritar.

Se vier na covardia

A mesma arma vou usar.

Porém se acordo quiser

A palavra desta mulher

Acordo não vai quebrar.

*

Dou um boi pra não entrar,

Pra não sair uma boiada

E contra raiva eu aviso

Que já estou vacinada.

E sou sim, flor que se cheira

Mas não caia na besteira

De querer me azucrinar.


--

Dalinha Catunda

VIVA A MULHER

quarta-feira, 7 de março de 2012

CONJUNTURA NACIONAL

Os quatro semáforos

Certo prefeito de Santa Rita do Sapucaí, nas Minas Gerais, ao ver nomeado um amigo para comandar o DETRAN, correu a Belo Horizonte, e não se fez de rogado. Foi logo pedindo:

- Amigo, me arranje umas sinaleiras para minha cidade. Vai ser o maior sucesso. Vai ajudar muito a minha popularidade.

O diretor, tomado de surpresa, ante tão inusitado pedido, procurou administrar a euforia do prefeito, mas não tinha como escapar à pressão:

- Compadre, está difícil arrumar esses aparelhos. Tenho de fazer uma grande reforma aqui na capital. Mas vou me esforçar para lhe arrumar quatro semáforos. Mas, por favor, não espalhe. Insisto: não espalhe.

E assim foi. Ao chegar a Santa Rita, um mês depois da entrega, ficou embasbacado. Viu os quatro semáforos colocados no mesmo lugar : o centro da cidade. Perguntou ao alcaide: "por que você mandou colocar todos eles naquele lugar"? Sorriso no canto da boca, o prefeito respondeu:

- Ora, compadre, você esqueceu? Me lembro bem: você bem que me pediu para não espalhar os faróis.

Manifesto do PMDB

O manifesto do PMDB, assinado pela maioria da bancada, é a gota d'água tirada do pote da insatisfação no qual mergulha o corpo partidário. O partido está insatisfeito com um 'certo' desprezo do governo. Não se trata apenas de queixas contra o menor espaço que tem hoje, comparado ao dos tempos de Lula. Trata-se da constatação de que a coalizão, na prática, não funciona. O Executivo quer os votos do PMDB. E só. Não faz consultas ao partido. Na hora H, a presidente Dilma vale-se da habilidade e do perfil harmônico do vice-presidente Michel Temer para acalmar os ânimos. Mas há limites nessa história de "vem-aqui-e-chega-pra-lá".

Mais reuniões

Diante da crise que pode se alastrar pelos desvãos do Parlamento, o vice-presidente Michel passa a ter papel transcendental. Não por acaso, a presidente Dilma quer fazer reuniões periódicas com ele. Agenda aberta, conversa franca.

Votação em peso

Por mais que existam divergências internas, o PMDB tem dado exemplo de unidade. Basta ver os votos por ocasião do Código Florestal e do Fundo Complementar do Servidor Público. Mostrou que vota unido. O líder Henrique Alves tem trabalhado com afinco para aprovar as matérias de interesse do Executivo. Mas não tem havido correspondência do governo. Só cobranças. Os peemedebistas desconfiam - e com razão - de que o governo quer minar suas forças e, ao mesmo tempo, ampliar as condições político-eleitorais do PT.

Presidência da Câmara

O PMDB quer presidir a Câmara Federal na próxima legislatura. E seu candidato é Henrique Alves, aliás, o parlamentar com o maior número de mandatos na Casa, 11. Henrique, para assegurar sua posição, procura se equilibrar entre a meta de atender os pleitos do Executivo e as demandas de sua bancada. Satisfazer, ao mesmo tempo, a uns e outros é tarefa quase impossível. Por isso, há um certo grupo - cerca de 20 - que tenta obstruir sua posição de liderança. Mas o vice-presidente, Michel Temer, do alto de sua índole equilibrada, funciona como algodão entre cristais.

Geddel, a trombeta

Há no PMDB alguns perfis que fazem barulho. Quem toca mais alto a trombeta é Geddel Vieira Lima, que exerceu o cargo de líder do partido, foi ministro da Integração Nacional, comanda o PMDB na Bahia, e hoje ocupa uma diretoria da Caixa Econômica Federal. Geddel é uma das melhores cabeças do partido. Pensa bem, mas é muito atirado. Não tem papas na língua. E não se cansa de fustigar, quase diariamente, o governador Jaques Wagner, adversário com quem quer medir forças. Ora, com tantas vozes dissonantes, torna-se mais complexa a tarefa do líder Henrique, de agradar todas as alas do partido.

Ameaça concreta

O PMDB está ameaçado de perder a posição de partido que detém o maior número de prefeituras do país, quase 1.200. O PT poderá tomar o seu lugar. E se isso ocorrer, o partido verá diminuídas as chances de poder vir a ser o parceiro principal do PT em 2014. Eis uma ameaça que paira sobre o PMDB.

Condições para ser governador

Solenidade de promoção da Polícia Militar em andamento, os agraciados com ascenso na carreira da corporação são chamados pelo cerimonial. Um a um recebe diplomação. Absorto em seu lugar, olhar atento a tudo, a maior autoridade presente à solenidade - governador Dinarte Mariz - resolve cochichar à orelha de Luciano Veras, secretário da Segurança do Estado:

- Coronel, eu não estou vendo entre os promovidos aquele meu afilhado que lhe fiz recomendação...

A resposta do secretário justifica o porquê da ausência do indicado pelo governador:

- Eu estive avaliando a carreira dele e observei que não havia condições para ganhar a promoção pretendida pelo senhor.

Sem maiores reservas, Dinarte alardeia sua contrariedade com a exclusão técnica:

- Luciano, que condições você está falando ? Se eu fosse atrás dessas condições nunca teria sido governador. (Quem conta o "causo" é Carlos Santos em seu livro Só Rindo 2)

Blocão

Há um bloquinho na Câmara, composto pelo PSB, PC do B, PMN e PRB. Pois bem, o sonho de Eduardo Campos é dar a esse ajuntamento o nome de blocão. A ideia é atrair o PSD de Kassab. Com essa junção, o bloco teria 110 deputados, que seria o maior da Casa. E, claro, com direito a reivindicar o comando parlamentar. Essa é mais uma ameaça que paira sobre o PMDB.

Mais insatisfeitos

Não é apenas o PMDB que se mostra insatisfeito com a participação no governo Dilma. Outros partidos também estão acusando o isolamento. Entre eles, o PSB, o PDT e o PR. A presidente reluta em nomear um indicado de Valdemar Costa Neto para o Ministério dos Transportes. Paulinho da Força quer indicar, pelo PDT, o novo ministro do Trabalho, mas a presidente tende a escolher o deputado gaúcho, Vieira da Cunha. O PSB, insatisfeito, deu apenas 2 votos favoráveis ao projeto do Fundo Complementar do Servidor Público.

Dilma, a durona

Pois é, depois de um ano, a presidente Dilma deixa ver, na plenitude, seu perfil: durona, cobradora, exigente, detalhista, apuro técnico, rigorosa, mandona, puxadora de orelha. O perfil da presidente amedronta ministros e assessores. Como consequência, distingue-se uma moldura de ministros sem autonomia, medrosos, pouco proativos. Muitas obras estão paradas. Verbas aprovadas para parlamentares não são liberadas. Esse é mais um motivo para descontentamento.

A humildade

"A humildade é virtude lúcida, sempre insatisfeita consigo mesma, mas que o seria ainda mais se não o fosse. É a virtude do homem que sabe não ser Deus". (André Comte-Sponville)

Militares da reserva

Pois é, os militares de pijama conseguiram o que queriam : ampla visibilidade. Fizeram um manifesto contra a Comissão da Verdade. E, de quebra, uma crítica ao governo. A presidente Dilma mandou puni-los. E, com essa decisão, a corrente de solidariedade entre os militares aposentados cresceu. Era o que eles queriam. Ora, a presidente deveria ter fechado os olhos a esses queixumes. Quem está na reserva só tem mesmo, como arma, o direito à livre expressão. Garantido pela Constituição. A impressão é a de que houve erro de conduta por parte do Executivo.

Quadro paulistano

A decisão de Serra, de participar do pleito paulistano, abre as seguintes hipóteses: maior probabilidade de segundo turno é com ele e Haddad. Mas tudo vai depender do papel de Lula. Terá o ex-presidente condições efetivas de participar ativamente do pleito? Até onde vai a motivação de Marta Suplicy com a candidatura Haddad? Geraldo Alckmin ajudará de maneira efetiva ou ficará na moita? Os tucanos estarão todos unidos ou haverá dissidentes/inconformados/indignados, como eventuais perdedores das prévias (Zé Aníbal e Ricardo Trípoli, por exemplo?).

Lula, corajoso

Quem conversou com Lula, recentemente, o achou muito deprimido. Ora, o ex-presidente passou por uma dura bateria de quimioterápicos. Os estados de depressão são previsíveis. Lula tem sido muito corajoso. Esta Coluna torce pela rápida recuperação deste grande brasileiro.

Governos sem grana

Os governos estaduais estão com a faca no pescoço. Os cofres estão vazios. Muitas obras paradas. Acorrem à Brasília. Ministros fazem ouvidos moucos.

Loucinha pintada

Etelvino Lins tomou posse no governo de Pernambuco. Logo no dia seguinte recebeu a visita de um tio do interior, que queria abraçar o sobrinho glorioso. O velho entrou meio desconfiado, sentou no sofá largo, começou a conversar. Mas tinha uma bronquite de abade. Tossia sem parar. Um emprego do palácio apanhou uma escarradeira toda desenhada em azul e a colocou discretamente ao lado. O velho tossiu, cuspiu no canto do chão. O empregado puxou a escarradeira mais para perto. O velho empurrou com o pé:

- Tervino, tira essa loucinha pintada daqui, senão eu acabo cuspindo dentro.

(Quem conta o "causo" é Sebastião Nery em seu Folclore Político)

O caso Valcke

Esse secretário-geral da FIFA, Jerome Valcke, é mesmo um desastrado. Sugeriu que o Brasil deveria ganhar "um chute no traseiro" para avançar na organização da Copa de 2014. O ministro do Esporte, Aldo Rebelo, pediu que a FIFA troque de interlocutor junto ao Brasil. Pano de fundo: soberania do Brasil e poderio da FIFA na organização/realização do evento. Até onde os poderes de ambos se cruzam?

Dilma para Merkel

A chanceler da Alemanha, Ângela Merkel, perguntou a presidente Dilma, que criticara "o tsunami" financeiro "o que você gostaria que nós fizéssemos?". Nossa mandatária respondeu: "primeiro, esterilizem a enxurrada de euros; segundo, queremos fazer boa parceria com Alemanha, desde que haja reciprocidade; terceiro, temos que tomar medidas de proteção à nossa moeda para proteger o mercado".

Ajudando Haddad

A presidente quer ajudar o pupilo de Lula, Fernando Haddad, a se eleger prefeito de São Paulo. Até toparia mexer no Ministério por conta dessa candidatura. Mas já avisou que não vai enfiar o pé na lama. Ajuda de longe. Para evitar desgaste. Aliás, esse tem sido o aviso da presidente aos correligionários.

Epílogo

"Um homem se propõe a tarefa de desenhar o mundo. Ao longo dos anos, povoa um espaço com imagens de províncias, de reinos, de montanhas, de baías, de naus, de ilhas, de peixes, de moradas, de instrumentos, de astros, de cavalos e de pessoas. Pouco antes de morrer, descobre que esse paciente labirinto de linhas traça a imagem de seu rosto". (Jorge Luis Borges)

Conselhos à presidente Dilma

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado à José Serra. Hoje, sua atenção se volta à presidente Dilma Rousseff:

1. A insatisfação na base governista tende a se expandir caso não sejam liberadas as verbas aprovadas no Orçamento para as regiões indicadas pelos parlamentares. Em um ano eleitoral, fechar os cofres para a esfera política parece incongruente.

2. A postura técnica, elogiável e recomendada, precisa ter uma contrapartida política. Não se governa sem apoio da base política.

3. A responsabilidade deve iluminar os caminhos decisórios. E vossa Excelência acerta em cheio quando decide colocar a régua no meio das demandas e pressões. Mas tenha cuidado para não exacerbar na postura.

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*Gaudêncio Torquato

segunda-feira, 5 de março de 2012

PATATIVA DO ASSARÉ - 103 ANOS!


Poetas niversitário,
Poetas de Cademia,
De rico vocabularo
Cheio de mitologia;
Se a gente canta o que pensa,
Eu quero pedir licença,
Pois mesmo sem português
Neste livrinho apresento
O prazê e o sofrimento
De um poeta camponês.

Eu nasci aqui no mato,
Vivi sempre a trabaiá,
Neste meu pobre recato,
Eu não pude estudá.
No verdô de minha idade,
Só tive a felicidade
De dá um pequeno insaio
In dois livro do iscritô,
O famoso professô
Filisberto de Carvaio.

No premêro livro havia
Belas figuras na capa,
E no começo se lia:
A pá — O dedo do Papa,
Papa, pia, dedo, dado,
Pua, o pote de melado,
Dá-me o dado, a fera é má
E tantas coisa bonita,
Qui o meu coração parpita
Quando eu pego a rescordá.

Foi os livro de valô
Mais maió que vi no mundo,
Apenas daquele autô
Li o premêro e o segundo;
Mas, porém, esta leitura,
Me tirô da treva escura,
Mostrando o caminho certo,
Bastante me protegeu;
Eu juro que Jesus deu
Sarvação a Filisberto.

Depois que os dois livro eu li,
Fiquei me sintindo bem,
E ôtras coisinha aprendi
Sem tê lição de ninguém.
Na minha pobre linguage,
A minha lira servage
Canto o que minha arma sente
E o meu coração incerra,
As coisa de minha terra
E a vida de minha gente.

Poeta niversitaro,
Poeta de cademia,
De rico vocabularo
Cheio de mitologia,
Tarvez este meu livrinho
Não vá recebê carinho,
Nem lugio e nem istima,
Mas garanto sê fié
E não istruí papé
Com poesia sem rima.

Cheio de rima e sintindo
Quero iscrevê meu volume,
Pra não ficá parecido
Com a fulô sem perfume;
A poesia sem rima,
Bastante me disanima
E alegria não me dá;
Não tem sabô a leitura,
Parece uma noite iscura
Sem istrela e sem luá.

Se um dotô me perguntá
Se o verso sem rima presta,
Calado eu não vou ficá,
A minha resposta é esta:
— Sem a rima, a poesia
Perde arguma simpatia
E uma parte do primô;
Não merece munta parma,
É como o corpo sem arma
E o coração sem amô.

Meu caro amigo poeta,
Qui faz poesia branca,
Não me chame de pateta
Por esta opinião franca.
Nasci entre a natureza,
Sempre adorando as beleza
Das obra do Criadô,
Uvindo o vento na serva
E vendo no campo a reva
Pintadinha de fulô.

Sou um caboco rocêro,
Sem letra e sem istrução;
O meu verso tem o chêro
Da poêra do sertão;
Vivo nesta solidade
Bem destante da cidade
Onde a ciença guverna.
Tudo meu é naturá,
Não sou capaz de gostá
Da poesia moderna.

Dêste jeito Deus me quis
E assim eu me sinto bem;
Me considero feliz
Sem nunca invejá quem tem
Profundo conhecimento.
Ou ligêro como o vento
Ou divagá como a lêsma,
Tudo sofre a mesma prova,
Vai batê na fria cova;
Esta vida é sempre a mesma.

Antônio Gonçalves da Silva, dito Patativa do Assaré, nasceu a 5 de março de 1909 na Serra de Santana, pequena propriedade rural, no município de Assaré, no Sul do Ceará. É o segundo filho de Pedro Gonçalves da Silva e Maria Pereira da Silva. Foi casado com D. Belinha, de cujo consórcio nasceram nove filhos. Publicou Inspiração Nordestina, em 1956, Cantos de Patativa, em 1966. Em 1970, Figueiredo Filho publicou seus poemas comentados Patativa do Assaré. Tem inúmeros folhetos de cordel e poemas publicados em revistas e jornais. Está sendo estudado na Sorbonne, na cadeira da Literatura Popular Universal, sob a regência do Professor Raymond Cantel. Patativa do Assaré era unanimidade no papel de poeta mais popular do Brasil. Para chegar onde chegou, tinha uma receita prosaica: dizia que para ser poeta não era preciso ser professor. 'Basta, no mês de maio, recolher um poema em cada flor brotada nas árvores do seu sertão', declamava.

Cresceu ouvindo histórias, os ponteios da viola e folhetos de cordel. Em pouco tempo, a fama de menino violeiro se espalhou. Com oito anos trocou uma ovelha do pai por uma viola. Dez anos depois, viajou para o Pará e enfrentou muita peleja com cantadores. Quando voltou, estava consagrado: era o Patativa do Assaré. Nessa época os poetas populares vicejavam e muitos eram chamados de 'patativas' porque viviam cantando versos. Ele era apenas um deles. Para ser melhor identificado, adotou o nome de sua cidade.

Filho de pequenos proprietários rurais, Patativa, nascido Antônio Gonçalves da Silva em Assaré, a 490 quilômetros de Fortaleza, inspirou músicos da velha e da nova geração e rendeu livros, biografias, estudos em universidades estrangeiras e peças de teatro. Também pudera. Ninguém soube tão bem cantar em verso e prosa os contrastes do sertão nordestino e a beleza de sua natureza. Talvez por isso, Patativa ainda influencie a arte feita hoje. O grupo pernambucano da nova geração 'Cordel do Fogo Encantado' bebe na fonte do poeta para compor suas letras. Luiz Gonzaga gravou muitas músicas dele, entre elas a que lançou Patativa comercialmente, 'A triste partida'. Há até quem compare as rimas e maneira de descrever as diferenças sociais do Brasil com as músicas do rapper carioca Gabriel Pensador. No teatro, sua vida foi tema da peça infantil 'Patativa do Assaré - o cearense do século', de Gilmar de Carvalho, e seu poema 'Meu querido jumento', do espetáculo de mesmo nome de Amir Haddad. Sobre sua vida, a obra mais recente é 'Poeta do Povo - Vida e obra de Patativa do Assaré' (Ed. CPC-Umes/2000), assinada pelo jornalista e pesquisador Assis Angelo, que reúne, além de obras inéditas, um ensaio fotográfico e um CD.

Como todo bom sertanejo, Patativa começou a trabalhar duro na enxada ainda menino, mesmo tendo perdido um olho aos 4 anos. No livro 'Cante lá que eu canto cá', o poeta dizia que no sertão enfrentava a fome, a dor e a miséria, e que para 'ser poeta de vera é preciso ter sofrimento'.

Patativa só passou seis meses na escola. Isso não o impediu de ser Doutor Honoris Causa de pelo menos três universidades. Não teve estudo, mas discutia com maestria a arte de versejar. Desde os 91 anos de idade com a saúde abalada por uma queda e a memória começando a faltar, Patativa dizia que não escrevia mais porque, ao longo de sua vida, 'já disse tudo que tinha de dizer'. Patativa morreu em 08 de julho de 2002 na cidade que lhe emprestava o nome.

NOS CAFUNDÓS DO SERTÃO - UM LIVRO EM LOUVOR A PATATIVA!


Dideus Sales, poeta magnífico e bondoso companheiro, nos abre a estante do novo milênio e dela retira uma preciosidade ímpar: um livro todo dedicado a Patativa, ou melhor, ao Sertão, visto que a ave e o homem, o mito e o sertanejo são raízes da mesma árvore lírica.

Homenagear muito cedo da vida ou somente após a morte é uma postura equivocada. Dideus trilhou o caminho certo: saúda o mestre da poesia popular no momento propício, na melhor idade.

Usando glosas decimais, amparado no mote “eu fui nascido e criado nos cafundós do sertão”, o poeta crateuense nos brinda com a densidade do seu cantar campesino.

Assim como Lampião, lâmpada justiceira na escuridão nordestina, Patativa enxerga com dificuldades. Talvez a luz que lhe falta nos olhos, Deus tenha colocado na alma.

Símbolo da genialidade matuta, o cancioneiro de Assaré conseguiu reunir – pasmem, letrados! – o vigor épico de um Camões, a sensibilidade ambiental de um Gonçalves Dias e o fulgor social de um Castro Alves.

Salve, Dideus, teu canto se eleva às alturas azuis do céu. Cantaste o mais luminoso dos nossos cantores, o poeta estrelado Patativa do Assaré.


(Por Júnior Bonfim, na Orelha do livro "NOS CAFUNDÓS DO SERTÃO", de Dideus Sales, em 2001, quando entre nós ainda cantava Patativa do Assaré. A propósito, o livro está sendo revisto, ampliado e reeditado agora.)