sexta-feira, 19 de novembro de 2010

FRANCISCO CARLOS MOURÃO PARTIU PARA O ORIENTE ETERNO


Sacudiu-me o coração a notícia, recebida hoje pela manhã, do desenlace de Francisco Carlos Mourão, ocorrido na noite de ontem.

Era respeitado e querido por onde circulava.

À família, nossa ativa solidariedade.

Escrevi, a propósito do Dia do Maçom, uma crônica em sua homenagem, dês que era um exemplo de pedreiro-livre.

Reproduzo-a aqui como preito de reconhecimento a alguém que sempre fez uso do prumo nas suas construções esotéricas:


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20 de agosto é o Dia do Maçom. Maçom, Maçonaria... Assunto que ainda suscita interrogações, mercê da aura folclórica, do véu de mistério e da cerca de curiosidade que sempre revestiu a Instituição e seus integrantes.

Dada sua característica discreta – que muita gente confunde com secreta – a Maçonaria, principalmente depois do lançamento de Best Sellers sobre o tema (como os livros de Dan Brown), tem despertado enorme interesse na juventude investigativa, nos amantes da sabedoria humana e nos estudiosos de todos os matizes.

Afinal, o que é ser Maçom no mundo contemporâneo? Qual o segredo que alimenta os Maçons e que tem perpassado os séculos aguçando a massa encefálica da humanidade?
Em verdade, o segredo da Maçonaria é simples. É o mesmo que impulsionou os maiores luminares da História. Não se encontra em um manual, mas no universo espiritual. É um tufão que sacode o âmago do ser e o retira da escuridão da consciência para colocá-lo sob a luz da profundidade.

Ser Maçom é consagrar-se à firmeza de caráter. Sem frouxidão, ser manso e humilde de coração. É libertar-se das baixas contingências gregárias. Subjugar a influência das ilusões. É combater o despotismo, os preconceitos e os erros. É promover o bem-estar da Pátria e da Humanidade. É hastear a bandeira da Fraternidade, da Igualdade e da Liberdade.

Ao redor desses ideais e postulados progressistas, homens livres e de bons costumes - sem distinção de raça, religião, ideário político ou posição social – têm se reunido para erigir templos à virtude e contribuir para o engrandecimento do edifício social da civilização humana. Esse é, em apertada síntese, o papel do Maçom na quadra atual.

Em Crateús, há dois prédios maçônicos. Um deles está localizado na rua que leva o nome do grande jurista que Viçosa do Ceará ofereceu ao mundo, Clóvis Beviláqua, o festejado autor do Código Civil de 1916. Ao lado desse templo, reside um dos seus fundadores, o mais antigo maçom em atividade na urbe e a principal coluna daquela oficina: Francisco Carlos Mourão.

Embora nascido, como o poeta do século XX, Gerardo Mello Mourão, na heróica Ipueiras, Francisco Carlos Mourão se fez crateuense. Passou por todas as provas da vida: do ar, do fogo, da água e da terra. Sagrou-se vitorioso. Virou um patriarca dos pedreiros livres da encosta do Poty. Instrutor dos que lapidam a esmeralda humana, desbastando a pedra bruta e a transformando em pedra cúbica, como um profeta que guia os seguidores na excelsa missão de espalhar a luz e reunir o que está esparso.

O rebento que o casal Aristides de Pinho e Raimunda Soares Mourão entregou ao universo no dia 13 de maio de 1933 é um modelo de pai, uma referência de dignidade, um farol de luta. Sabendo que a família é um dos principais alicerces da harmonia interior, casou-se com Jacira Mourão Lima, com quem procriou Rosângela, Janete e Gilson.

Ouvi falar dele a primeira vez ainda menino. Após ingerir um delicioso refrigerante, perquiri a origem. Disseram que era o Guaraná Cassino, orgulho dos crateuenses nos idos de 60 e 70, fruto da aura empreendedora de Chico Carlos Mourão. Tempos depois, tive a oportunidade de conhecê-lo pessoalmente quando apadrinhou meu irmão caçula.

Sua postura reta, altiva e vertical, sempre me impressionou. Aprendi que o homem maduro é aquele que enfrenta com a mesma serenidade tanto um terremoto de tristeza como uma explosão de alegria. Posso afirmar que, sem embargo, Carlos Mourão pisou os prados da maturidade. Descobriu o verdadeiro Segredo Maçônico. Naquele sentido que esposou um dos mais emblemáticos maçons de Portugal, o iluminado poeta Fernando Pessoa:

“O verdadeiro Segredo Maçônico...
É um segredo de vida
e não de ritual
e do que se lhe relaciona.
Os Graus Maçônicos comunicam àqueles que os recebem,
sabendo como recebê-los,
um certo espírito,
uma certa aceleração da vida
do entendimento
e da intuição,
que atua como uma espécie
de chave mágica dos próprios símbolos,
e dos símbolos
e rituais não maçônicos,
e da própria vida.
É um espírito,
um sopro posto na Alma,
e, por conseguinte,
pela sua natureza,

...incomunicável”.

(Por Júnior Bonfim).

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

CONJUNTURA NACIONAL

Newtão

Encontrei-me, sábado último, com o ex-governador mineiro e deputado Newton Cardoso em uma roda de conversa na Casa do Presidente da Câmara. Ouvi histórias muito engraçadas e causos da política mineira. Newtão mostrou que é bom de prosa. Pois bem, que ele me perdoe, mas abro a coluna de hoje, tomando emprestadas do amigo Sebastião Nery alguns episódios que têm como alvo o próprio grande empresário e político. Newton Cardoso foi prefeito de Contagem, deputado Federal, governador, vice-governador de Minas Gerais e, agora, é novamente deputado. Os adversários lhe atribuem velhas gafes que a UDN atribuía a Benedito Valadares:

1. Dona Dezinha: "Se eu soubesse que meu filho Newton ia ser importante e virar governador de Minas, eu tinha botado ele para estudar de pequeno."

2. Preocupado com as notícias de que o leite estava contaminado, Newton pegou um pastel e começou a mexer dentro da xícara. "Por que você está fazendo isso?" "Para pasteurizar o leite."

3. Newton no palanque: "Minas sempre se preocupou mais com a criação de bovinos e equinos. Agora, eu vou cuidar também da criação de porquinos."

4. Newton, numa entrevista: "Precisamos acabar com a fila do IMPS." O assessor lhe fala: "Não é IMPS, é INPS." "Nada disso. Desde lá de Brumado que eu aprendi que antes de P e B se usa M."

5. Comício em Betim: "O problema de Minas é falta de fé. Vamos juntar minha fé, sua fé, nossas fezes, para salvar Minas."

Fusão ou confusão?

Neste momento, alguns partidos acendem o pavio das fusões. Primeiro, o DEM, que poderia entrar em fusão com o PMDB. Essa era a intenção inicial do prefeito Gilberto Kassab. Imaginava ele que o DEM, a partir da derrota de José Serra, teria de se fortalecer caso se fundisse com outra legenda. Como o PSDB tem muitos caciques, Kassab imaginou o PMDB como a sigla ideal. Lá, ele tem muitos amigos, a partir do presidente Michel Temer, recém eleito vice-presidente da República. Poderia ser um bom casamento. Mas a coisa desandou e causou confusão.

DEM, ícone conservador

A cúpula do partido está cindida. Os Bornhausen, pai e filho, até poderiam topar a parada. Marco Maciel, que acaba de perder a eleição para o Senado, em Pernambuco, também toparia. ACM Neto aceitaria caso viesse a liderar a sigla na Bahia, mas Geddel, um peemedebista histórico, jamais aceitaria essa condição. Mas quem brecou a parada foram os Maia, César Maia, que perdeu a eleição para o governo do Rio de Janeiro, e o filho, Rodrigo, presidente da sigla e reeleito para a Câmara dos Deputados. Rodrigo surpreendeu com esta: o DEM vai assumir a liderança do conservadorismo nacional. Será, assim, de cara aberta a entidade que assumirá o espaço da direita.

Entre centro e direita

Entre o centro e a direita, o prefeito Gilberto Kassab não tem dúvidas. Prefere o espaço centro-democrático do PMDB. Não se sente confortável em um partido que quer assumir posições retrógradas e conservadoras. Acontece que essa operação não será coisa fácil. Algumas figuras do PMDB de São Paulo, receosas de perderem posição na sigla, temem que Kassab, mais cedo ou mais tarde, lidere o partido. O prefeito só entrará no PMDB com o endosso do presidente Temer, com quem conversa sempre. São Paulo, por outro lado, é o principal colégio eleitoral do país. Nesse Estado, o partido definhou nos últimos anos. Precisa de oxigênio, um novo pólo de poder, pessoas com capacidade de aglutinação. Gilberto Kassab é o perfil adequado que chega no momento certo. Lá para fevereiro ou março, essa operação deverá se concretizar.

Comandos das casas

A interrogação continua : quem comandará a Câmara e o Senado? Se José Sarney quiser continuar à frente da Câmara Alta, tem todas as condições. O maior empecilho se chama dona Marly, sua mulher, que quer ver o marido livre de maiores pressões. Sarney seria imbatível. Se não topar, para cuidar melhor da saúde, poderá canalizar sua votação para Edison Lobão. Mas este gostaria de voltar ao Ministério das Minas e Energia. Dizem que a propensão da presidente Dilma é a de mudar todos os comandos, deixando apenas um ou outro, como Mantega, na Fazenda.

Alternativas

Se Edison Lobão voltar ao Ministério, o nome de Garibaldi Alves emerge. O senador, com quem me encontrei ontem à noite, repete o mantra: "tenho um compromisso com Henrique". Henrique Alves, seu primo, quer comandar a Câmara no primeiro biênio. Ocorre que o PT também luta pela direção. Os nomes de Cândido Vaccarezza, Arlindo Chinaglia, João Paulo Cunha e o atual vice da Câmara, Marco Maia, estão na mesa. Vaccarezza teria maior cacife por conta do trabalho realizado como líder do Governo naquela Casa. Ele quer comandar a Câmara, a partir de 2011, sabedor que, em 2013, quando se inicia o segundo biênio, os rumos seriam outros. No PT, a disputa entre elas é mais árdua que no PMDB. Henrique até poderia esperar, Vacarezza, não. O processo de canibalização entre petistas é comparável aos tempos do canibalismo indígena.

Nesse caso...

Se Vaccarezza ganhar a parada, Henrique Alves deverá se preparar para o segundo biênio, que, sob o ponto de vista de peso e importância, é melhor, eis que mais próximo ao calendário eleitoral de 2014. Nesse caso, Garibaldi Alves, o filho, teria chances. Mas os votos dependem, ainda, dos rumos a serem tomados por Sarney e Renan Calheiros. Este senador, que já presidiu a Casa, tem vontade de voltar à cadeira presidencial. Esbarra, porém, no imbróglio que o fez renunciar à presidência. Calheiros, vale a pena lembrar, continua a ter grande força junto ao corpo de senadores do PMDB. Ao lado dele, circula com desenvoltura o recém reeleito e poderoso senador Romero Jucá.

A vez de Henrique

O PMDB é matreiro. Pode formar um blocão com PR, PP, PTB e PSC, que reunirá sob o mesmo abrigo 202 deputados. A se confirmar esse conjunto, vejo Henrique Alves solidamente sentado na cadeira de presidente da Câmara. O PT teria ido com muita sede ao pote. Anunciou a formação de bloco, animando, então, o PMDB a entrar na arena.

Adeus, Bono

Sexta passada, no final da tarde, deixou-nos desolados o amigo Julio Bono. Morto em circunstâncias trágicas e surpreendentes, em Porto de Galinhas/PE. Ali se encontrava para descansar da intensa labuta da campanha eleitoral. Braço direito de Michel Temer, Bono, o amigo faz-tudo, morreu afogado. Levado por uma forte corrente, logo no início da praia, caiu num buraco. Deve ter desfalecido por conta de forte batida em uma pedra ou ter sido vítima de mal súbito. Só pode ser isso. Bono era coronel, bombeiro da PM e tinha, até, curso de mergulho. Seus inúmeros amigos, do PMDB e de outros partidos, acorreram à Brasília para prestar sua última homenagem a quem espalhou o bem para todos os lados.

PMDB unido

Este consultor teve oportunidade de ouvir e conversar com deputados peemedebistas de todo o país, que foram à Brasília prestar uma última homenagem a Julio Bono. O PMDB nunca esteve tão unido como hoje. A unidade construída por Michel Temer é maior do que a conseguida, um dia, por Ulysses Guimarães. Essa era a tônica de todas as conversas. E mais: Michel foi claro na indicação de que fará votar, na próxima Convenção do partido, o fechamento de posições assumidas nacionalmente pela sigla. Decisão tomada pelo PMDB deverá ser obedecida. E disse mais: quem não se dispuser a cumprir a verticalidade decisória, deve tomar outros caminhos.

Autoridade Olímpica

O boa praça Orlando Silva poderá ganhar a nomeação de "Autoridade Olímpica" e, nessa condição, coordenar os programas e atividades relacionadas à Copa de 2014 e às Olimpíadas de 2016. O ideal seria acumular as funções com o cargo de ministro dos Esportes. Mas há um grupo forte que deseja repartir os comandos.

Painel na OAB

Em Brasília, participarei como expositor de painel sobre Sistema de Governo, promovido pelo Conselho Federal da OAB. O primeiro painel será presidido pelo ministro Enrique Ricardo Lewandowski, tendo como expositores, ao meu lado, o jurista e ex-presidente do STF, Carlos Mário da Silva Velloso e o senador Demóstenes Torres. Discorreremos sobre Reeleição e Prazo de Mandato do Presidente da República. Noutra mesa, estarão o presidente da Câmara, Michel Temer, o jurista Luis Roberto Barroso e a cientista política Argelina Figueiredo, que debaterão o tema SemiPresidencialismo como Mecanismo de Atenuação da Hegemonia Presidencial no Brasil.

Sistemas eleitoral e partidário

O segundo painel será sobre o Sistema Eleitoral, presidido pelo ministro Carlos Ayres Britto, e com exposição sobre Sistema Distrital Misto por Luiz Viana Queiroz, Jairo Nicolau e Pedro Simon; e exposição sobre Sistema de Lista Fechada, Restrições às Coligações por Pedro Abramovay, Marcus André Melo e Miro Teixeira. O terceiro painel será sobre Sistema Partidário, envolvendo as temáticas Cláusula de Barreira, Fidelidade Partidária, com exposições de Claudio Pereira de Souza Neto, André Marenco e Aldo Rebelo; e Financiamento Público de Campanha, com exposições de José Paulo Sepúlveda Pertence, Lucio Rennó e José Eduardo Cardozo.

Estilo Dilma

Ninguém espere por leniência ou tibieza por parte da nova presidente. Dilma usará a autoridade no limite da liturgia do cargo. Diz-se que não quer formar um Ministério com pessoas derrotadas no pleito. Poder Executivo não é um "vale dos caídos". Portanto, ministros derrotados devem rever planos de volta ao governo. Será uma controladora rigorosa de programas e ações. Sim, sim, não, não.

Rescaldos na Justiça

Os rescaldos das lutas eleitorais tendem a chegar à Justiça. Partidos começam a arrumar dossiês para encaminhamento ao TSE. Vão apontar processos de cooptação ilegal de votos. Entre os casos mais escabrosos, aponta-se a eleição de Roraima, onde o tucano José Anchieta está sendo torpedeado por seus adversários.

Temer e a Defesa

Michel Temer poderá acumular a vice presidência da República com a Pasta da Defesa. O atual vice José Alencar também fez essa acumulação no passado.

Mulheres no Governo

Não é de admirar se Dilma Rousseff adensar a participação de mulheres no governo, seja em Ministérios seja em cargos importantes do segundo escalão. Ela quer dar um significado todo especial à condição feminina. A jovem deputada Manuela D'Ávila, do PC do B do Rio Grande do Sul, tem chances de fazer parte da foto oficial do primeiro Ministério.

Cardozo

Comenta-se que o deputado José Eduardo Cardozo, secretário geral do PT e um dos comandantes da campanha, seria nomeado para o STF. Este consultor sempre trabalhou com a ideia de que ele seria o figurino exemplar para o Ministério da Justiça. O cargo lhe cai muito bem, professor de Direito Constitucional que é.

Zum-zum-zum

Há um zum-zum-zum em meios empresariais de que, diante de um tsunami internacional, a partir de ondas em formação nas praias norte-americanas e chinesas (desvalorização das moedas), as condições brasileiras serão bem diferentes das exibidas no ciclo Lula. Temores que aparecem como nuvens cinzentas.

Touraine e o risco

O sociólogo Alain Touraine, muito amigo do ex-presidente FHC, identifica riscos de radicalização por parte do governo Dilma. Teme ele por uma guinada populista, com ameaças à liberdade de imprensa e de organização. Por mais que este consultor respeite o grande pensador, ousa discordar. Não há clima no país para um retrocesso. As condições macroeconômicas - e a interdependência entre as fronteiras do mundo globalizado -, as condições políticas (o presidencialismo de coalizão) e as condições sociais (os novos pólos do poder social, por meio das entidades intermediárias) inviabilizam uma volta ao passado. E nem o PT toparia chancelar suas alas mais radicais.

Conselho aos comandos estaduais

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado aos governantes. Hoje, volta novamente sua atenção aos governantes, particularmente aos comandantes das máquinas estaduais:

1. Escolham os melhores quadros do Estado - em todas as áreas - para integrar a estrutura governamental.

2. Evitem lotear a máquina com atores sem preparo e brilho. As administrações estaduais carecem de inovação, qualidade e constante esforço de aperfeiçoamento.

3. É claro que os partidos que chegaram ao poder carecem de prestigio e força nas novas administrações. Mas não podem e não devem comprometer áreas e espaços nobres da gestão, sob pena de formar inviáveis as metas governamentais.

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(Por Gaudêncio Torquato)

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

RACHEL DE QUEIROZ - CEM ANOS


"[...] tento, com a maior insistência, embora com tão
precário resultado (como se tornou evidente), incorporar
a linguagem que falo e escuto no meu ambiente nativo à
língua com que ganho a vida nas folhas impressas. Não
que o faça por novidade, apenas por necessidade.
Meu parente José de Alencar quase um século atrás vivia
brigando por isso e fez escola." (Rahel de Queiroz)



Rachel de Queiroz, nasceu em Fortaleza - CE, no dia 17 de novembro de 1910, filha de Daniel de Queiroz e de Clotilde Franklin de Queiroz, descendendo, pelo lado materno, da estirpe dos Alencar (sua bisavó materna — "dona Miliquinha" — era prima José de Alencar, autor de "O Guarani"), e, pelo lado paterno, dos Queiroz, família de raízes profundamente lançadas em Quixadá, onde residiam e seu pai era Juiz de Direito nessa época.

Em 1913, voltam a Fortaleza, face à nomeação de seu pai para o cargo de promotor. Após um ano no cargo, ele pede demissão e vai lecionar Geografia no Liceu. Dedica-se pessoalmente à educação de Rachel, ensinando-a a ler, cavalgar e a nadar. As cinco anos a escritora leu "Ubirajara", de José de Alencar, "obviamente sem entender nada", como gosta de frisar.

Fugindo dos horrores da seca de 1915, em julho de 1917 transfere-se com sua família para o Rio de Janeiro, fato esse que seria mais tarde aproveitado pela escritora como tema de seu livro de estréia, "O Quinze".

Logo depois da chegada, em novembro, mudam-se para Belém do Pará, onde residem por dois anos. Retornam ao Ceará, inicialmente para Guaramiranga e depois Quixadá, onde Rachel é matriculada no curso normal, como interna do Colégio Imaculada Conceição, formando-se professora em 1925, aos 15 anos de idade. Sua formação escolar pára aí.

Rachel retorna à fazenda dos pais, em Quixadá. Dedica-se inteiramente à leitura, orientada por sua mãe, sempre atualizada com lançamento nacionais e estrangeiros, em especial os franceses. O constante ler estimula os primeiros escritos. Envergonhada, não mostrava seus textos a ninguém.

Em 1926, nasce sua irmã caçula, Maria Luiza. Os outros irmãos eram Roberto, Flávio e Luciano, já falecidos).

Com o pseudônimo de "Rita de Queluz" ela envia ao jornal "O Ceará", em 1927, uma carta ironizando o concurso "Rainha dos Estudantes", promovido por aquela publicação. O diretor do jornal, Júlio Ibiapina, amigo de seu pai, diante do sucesso da carta a convida para colaborar com o veículo. Três anos depois, ironicamente, quando exercia as funções de professora substituta de História no colégio onde havia se formado, Rachel foi eleita a "Rainha dos Estudantes". Com a presença do Governador do Estado, a festa da coroação tinha andamento quando chega a notícia do assassinato de João Pessoa. Joga a coroa no chão e deixa às pressas o local, com uma única explicação "Sou repórter".

Seu pai adquiri o Sítio do Pici, perto de Fortaleza, para onde a família se transfere. Sua colaboração em "O Ceará" torna-se regular. Publica o folhetim "História de um nome" — sobre as várias encarnações de uma tal Rachel — e organiza a página de literatura do jornal.

Submetida a rígido tratamento de saúde, em 1930, face a uma congestão pulmonar e suspeita de tuberculose, a autora se vê obrigada a fazer repouso e resolve escrever "um livro sobre a seca". "O Quinze" — romance de fundo social, profundamente realista na sua dramática exposição da luta secular de um povo contra a miséria e a seca — é mostrado aos pais, que decidem "emprestar" o dinheiro para sua edição, que é publicada em agosto com uma tiragem de mil exemplares. Diante da reação reticente dos críticos cearenses, remete o livro para o Rio de Janeiro e São Paulo, sendo elogiado por Augusto Frederico Schmidt e Mário de Andrade. O livro logo transformaria Rachel numa personalidade literária. Com o dinheiro da venda dos exemplares, a escritora "paga" o empréstimo dos pais.

Em março de 1931, recebe no Rio de Janeiro o prêmio de romance da Fundação Graça Aranha, mantida pelo escritor, em companhia de Murilo Mendes (poesia) e Cícero Dias (pintura). Conhece integrantes do Partido Comunista; de volta a Fortaleza ajuda a fundar o PC cearense.

Casa-se com o poeta bissexto José Auto da Cruz Oliveira, em 1932. É fichada como "agitadora comunista" pela polícia política de Pernambuco. Seu segundo romance, "João Miguel", estava pronto para ser levado ao editor quando a autora é informada de que deveria submetê-lo a um comitê antes de publicá-lo. Semanas depois, em uma reunião no cais do porto do Rio de Janeiro, é informada de que seu livro não fora aprovado pelo PC, porque nele um operário mata outro. Fingindo concordar, Rachel pega os originais de volta e, depois de dizer que não via no partido autoridade para censurar sua obra, foge do local "em desabalada carreira", rompendo com o Partido Comunista.

Publica o livro pela editora Schmidt, do Rio, e muda-se para São Paulo, onde se aproxima do grupo trotskista.

Nasce, em Fortaleza, no ano de 1933, sua filha Clotilde.

Muda-se para Maceió, em 1935, onde faz amizade com Jorge de Lima, Graciliano Ramos e José Lins do Rego. Aproxima-se, também, do jornalista Arnon de Mello (pai do futuro presidente da República, Fernando Collor, que a agraciou com a Ordem Nacional do Mérito). Sua filha morre aos 18 meses, vítima de septicemia.

O lançamento do romance "Caminho de Pedras", pela José Olympio - Rio, se dá em 1937, que seria sua editora até 1992. Com a decretação do Estado Novo, seus livros são queimados em Salvador - BA, juntamente com os de Jorge Amado, José Lins do Rego e Graciliano Ramos, sob a acusação de subversivos. Permanece detida, por três meses, na sala de cinema do quartel do Corpo de Bombeiros de Fortaleza.

Em 1939, separa-se de seu marido e muda-se para o Rio, onde publica seu quarto romance, "As Três Marias".

Por intermédio de seu primo, o médico e escritor Pedro Nava, em 1940 conhece o também médico Oyama de Macedo, com quem passa a viver. O casamento duraria até à morte do marido, em 1982. A notícia de que uma picareta de quebrar gelo, por ordem de Stalin, havia esmigalhado o crânio de Trótski faz com que ela se afaste da esquerda.

Deixa de colaborar, em 1944, com os jornais "Correio da Manhã", "O Jornal" e "Diário da Tarde", passando a ser cronista exclusiva da revista "O Cruzeiro", onde permanece até 1975.

Estabelece residência na Ilha do Governador, em 1945.

Seu pai vem a falecer em 1948, ano em que publica "A Donzela e a Moura Torta". No ano de 1950, escreve em quarenta edições da revista "O Cruzeiro" o folhetim "O Galo de Ouro".

Sua primeira peça para o teatro, "Lampião", é montada no Teatro Municipal do Rio de Janeiro e no Teatro Leopoldo Fróes, em São Paulo, no ano de 1953. É agraciada, pela montagem paulista, com o Prêmio Saci, conferido pelo jornal "O Estado de São Paulo".

Recebe, da Academia Brasileira de Letras, em 1957, o Prêmio Machado de Assis, pelo conjunto de sua obra.

Em 1958, publica a peça "A beata Maria do Egito", montada no Teatro Serrador, no Rio, tendo no papel-título a atriz Glauce Rocha.

O presidente da República, Jânio Quadros, a convida para ocupar o cargo de ministra da Educação, que é recusado. Na época, justificando sua decisão, teria dito: "Sou apenas jornalista e gostaria de continuar sendo apenas jornalista."

O livro "As Três Marias", com ilustrações de Aldemir Martins, em tradução inglesa, é lançado pela University of Texas Press, em 1964.

O golpe militar de 1964 teve em Rachel uma colaboradora, que "conspirou" a favor da deposição do presidente João Goulart.

O presidente general Humberto de Alencar Castelo Branco, seu conterrâneo e aparentado, no ano de 1966 a nomeia para ser delegada do Brasil na 21ª. Sessão da Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas, junto à Comissão dos Direitos do Homem.

Passa a integrar o Conselho Federal de Cultura, em 1967, e lá ficaria até 1985. Depois de visitar a escritora na Fazenda Não me Deixes, em Quixadá, o presidente Castelo Branco morre em desastre aéreo.

Estréia na literatura infanto-juvenil, em 1969, com "O Menino Mágico", em 1969.

No ano de 1975, publica o romance "Dôra, Doralina".

Em 1977, por 23 votos a 15, e um em branco, Rachel de Queiroz vence o jurista Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda e torna-se a primeira mulher a ser eleita para a Academia Brasileira de Letras. A eleição acontece no dia 04 de agosto e a posse, em 04 de novembro. Ocupa a cadeira número 5, fundada por Raimundo Correia, tendo como patrono Bernardo Guimarães e ocupada sucessivamente pelo médico Oswaldo Cruz, o poeta Aluísio de Castro e o jurista, crítico e jornalista Cândido Mota Filho.

Seu livro, "O Quinze", é publicado no Japão pela editora Shinsekaisha e na Alemanha pela Suhrkamp, em 1978.

Em 1980, a editora francesa Stock lança "Dôra, Doralina". Estréia da Rede Globo de Televisão a novela "As Três Marias", baseada no romance homônimo da escritora.

Com direção de Perry Salles, estréia no cinema a adaptação de "Dôra, Doralina", em 1981.

Em 1985, é inaugurada em Ramat-Gau, Tel Aviv (Israel), a creche "Casa de Rachel de Queiroz". "O Galo de Ouro" é publicado em livro.

Retorna à literatura infantil, em 1986, com "Cafute & Perna-de-Pau".

A José Olympio Editora lança, em 1989, sua "Obra Reunida", em cinco volumes, com todos os livros que Rachel publicara até então destinados ao público adulto.

Segundo notícia que circulou em 1991, a Editora Siciliano, de São Paulo, pagou US$150.000,00 pelos direitos de publicação da obra completa de Rachel.

Já na nova editora, lança em 1992 o romance "Memorial de Maria Moura".

Em 1993, recebe dos governos do Brasil e de Portugal, o Prêmio Camões e da União Brasileira de Escritores, o Juca Pato. A Siciliano inicia o relançamento de sua obra completa.

1994 marca a estréia, na Rede Globo de Televisão, da minissérie "Memorial de Maria Moura", adaptada da obra da escritora. Tendo no papel principal a atriz Glória Pires, notícias dão conta que Rachel recebeu a quantia de US$50.000,00 de direitos autorais.

Inicia seu livro de memórias, em 1995, escrito em colaboração com a irmã Maria Luiza, que é publicado posteriormente com o título "Tantos anos".

Pelo conjunto de sua obra, em 1996, recebe o Prêmio Moinho Santista.

Em 2000, é publicado "Não me Deixes — Suas histórias e sua cozinha", em colaboração com sua irmã, Maria Luiza.

Em novembro deste ano, quando a escritora completou 90 anos de idade, foi inaugurada, na Academia Brasileira de Letras, a exposição "Viva Rachel". São 17 painéis e um ensaio fotográfico de Eduardo Simões resumindo o que os organizadores da mostra chamam de “geografia interior de Rachel, suas lembranças e a paisagem que inspirou a sua obra”.

Rachel de Queiroz chega aos 90 anos afirmando que não gosta de escrever e o faz para se sustentar. Ela lembra que começou a escrever para jornais aos 19 anos e nunca mais parou, embora considere pequeno o número de livros que publicou. “Para mim, foram só cinco, (além de O Quinze, As Três Marias, Dôra, Doralina, O Galo de Ouro e Memorial de Maria Moura), pois os outros eram compilações de crônicas que fiz para a imprensa, sem muito prazer de escrever, mas porque precisava sustentar-me”, recorda ela. “Na verdade, eu não gosto de escrever e se eu morrer agora, não vão encontrar nada inédito na minha casa”.

Recebe, em 06-12-2000, o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

Em 2003, é inaugurado em Quixadá (CE), o Centro Cultural Rachel de Queiroz.

Faleceu, dormindo em sua rede, no dia 04-11-2003, na cidade do Rio de Janeiro. Deixou, aguardando publicação, o livro "Visões: Maurício Albano e Rachel de Queiroz", uma fusão de imagens do Ceará fotografadas por Maurício com textos de Rachel de Queiroz.

Obras:

Individuais:

- Romances:

- O quinze (1930)
- João Miguel (1932)
- Caminho de pedras (1937)
- As três Marias (1939)
- Dôra, Doralina (1975)
- O galo de ouro (1985) - folhetim na revista " O Cruzeiro", (1950)
- Obra reunida (1989)
- Memorial de Maria Moura (1992)

- Literatura Infanto-Juvenil:

- O menino mágico (1969)
- Cafute & Pena-de-Prata (1986)
- Andira (1992)
- Cenas brasileiras - Para gostar de ler 17.

- Teatro:

- Lampião (1953)
- A beata Maria do Egito (1958)
- Teatro (1995)
- O padrezinho santo (inédita)
- A sereia voadora (inédita)

- Crônica:

- A donzela e a moura torta (1948);
- 100 Crônicas escolhidas (1958)
- O brasileiro perplexo (1964)
- O caçador de tatu (1967)
- As menininhas e outras crônicas (1976)
- O jogador de sinuca e mais historinhas (1980)
- Mapinguari (1964)
- As terras ásperas (1993)
- O homem e o tempo (74 crônicas escolhidas}
- A longa vida que já vivemos
- Um alpendre, uma rede, um açude: 100 crônicas escolhidas
- Cenas brasileiras
- Xerimbabo (ilustrações de Graça Lima)
- Falso mar, falso mundo - 89 crônicas escolhidas (2002)

- Antologias:

- Três romances (1948)

- Quatro romances (1960) (O Quinze, João Miguel, Caminho de Pedras,
As três Marias)

- Seleta (1973) - organização de Paulo Rónai

- Livros em parceria:

- Brandão entre o mar e o amor (romance - 1942) - com José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Aníbal Machado e Jorge Amado.

- O mistério dos MMM (romance policial - 1962) - Com Viriato Corrêa, Dinah Silveira de Queiroz, Lúcio Cardoso, Herberto Sales, Jorge Amado, José Condé, Guimarães Rosa, Antônio Callado e Orígines Lessa.

- Luís e Maria (cartilha de alfabetização de adultos - 1971) - Com Marion Vilas Boas Sá Rego.

- Meu livro de Brasil (Educação Moral e Cívica - 1º. Grau, Volumes 3, 4 e 5 - 1971) - Com Nilda Bethlem.

- O nosso Ceará (com sua irmã, Maria Luiza de Queiroz Salek), relato, 1994.

- Tantos anos (com sua irmã, Maria Luiza de Queiroz Salek), auto-biografia, 1998.

- O Não Me Deixes – Suas Histórias e Sua Cozinha (com sua irmã, Maria Luiza de Queiroz Salek), 2000.

Obras traduzidas pela escritora:

- Romances:

AUSTEN, Jane. Mansfield Parlz (1942).
BALZAC, Honoré de. A mulher de trinta anos (1948).
BAUM, Vicki. Helena Wilfuer (1944).
BELLAMANN, Henry. A intrusa (1945).
BOTTONE, Phyllis. Tempestade d'alma (1943).
BRONTË, Emily. O morro dos ventos uivantes (1947).
BRUYÈRE, André. Os Robinsons da montanha (1948).
BUCK, Pearl. A promessa (1946).
BUTLER, Samuel. Destino da carne (1942).
CHRISTIE, Agatha. A mulher diabólica (1971).
CRONIN, A. J. A família Brodie (1940).
CRONIN, A. J. Anos de ternura (1947).
CRONIN, A. J. Aventuras da maleta negra (1948).
DONAL, Mario. O quarto misterioso e Congresso de bonecas (1947).
DOSTOIÉVSKI, Fiódor. Humilhados e ofendidos (1944).
DOSTOIÉVSKI, Fiódor. Recordações da casa dos mortos (1945).
DOSTOIÉVSKI, Fiódor. Os demônios (1951).
DOSTOIÉVSKI, Fiódor. Os irmãos Karamazov (1952) 3 v.
DU MAURIER, Daphne. O roteiro das gaivotas (1943).
FREMANTLE, Anne. Idade da fé (1970).
GALSWORTHY, John. A crônica dos Forsyte (1946) 3 v.
GASKELL, Elisabeth. Cranford (1946).
GAUTHIER, Théophile. O romance da múmia (1972).
HEIDENSTAM, Verner von. Os carolinos: crônica de Carlos XII (1963).
HILTON, James. Fúria no céu (1944).
LA CONTRIE, M. D'Agon de. Aventuras de Carlota (1947).
LOISEL, Y. A casa dos cravos brancos (1947).
LONDON, Jack. O lobo do mar (1972).
MAURIAC, François. O deserto do amor (1966).
PROUTY, Oliver. Stella Dallas (1945).
REMARQUE, Erich Maria. Náufragos (1942).
ROSAIRE, Forrest. Os dois amores de Grey Manning (1948).
ROSMER, Jean. A afilhada do imperador (1950).
SAILLY, Suzanne. A deusa da tribo (1950).
VERDAT, Germaine. A conquista da torre misteriosa (1948).
VERNE, Júlio. Miguel Strogoff (1972).
WHARTON, Edith. Eu soube amar (1940).
WILLEMS, Raphaelle. A predileta (1950).

- Biografias e memórias:

BUCK, Pearl. A exilada: retrato de uma mãe americana (1943).
CHAPLIN, Charles. Minha vida (caps. 1 a 7 (1965).
DUMAS, Alexandre. Memórias de Alexandre Dumas, pai (1947).
TERESA DE JESUS, Santa. Vida de Santa Teresa de Jesus (1946).
STONE, Irwin. Mulher imortal (biografia de Jessie Benton Fremont (1947).
TOLSTÓI, Leon. Memórias (1944).

- Teatro:

CRONIN, A. J. Os deuses riem (1952).


Os dados acima foram obtidos em livros de e sobre a autora, sites da Internet, jornais e revistas de circulação nacional.


(Site: releituras.com)

terça-feira, 16 de novembro de 2010

VERDADES OCULTAS

Foi apenas o fechar das urnas, e as verdades começaram a aparecer. A CPMF reaparece com a presidente eleita e alguns governadores falando dela com uma sinceridade que lhes faltou na campanha.

O governador do Rio entrou no STF dizendo que o sistema de partilha do petróleo prejudica o estado. O sistema é ideia de Dilma Rousseff, a quem Sérgio Cabral deu seu entusiasmado apoio.

Tenham compostura senhores e senhoras da política: nós não somos bobos. Quantas vezes vocês acham que podem nos enganar mudando de tom, discurso e propósitos entre o pré e o pós-urnas?

O banco PanAmericano estava quebrado antes das eleições, mas as informações sobre isso apareceram apenas alguns dias depois. O que torna o caso inegavelmente uma questão de interesse e dinheiro públicos é a compra extemporânea de 49% do banco pela Caixa Econômica Federal e a cegueira coletiva que atingiu comprador e fiscalizadores.

PT e PMDB, os dois maiores partidos da coalizão, começaram a se engalfinhar em público pelos cargos, como se fosse uma disputa do butim de uma batalha que eles venceram. Fica-se sabendo que o consumidor — e não as empresas como Itaipu e Furnas — é que pagará pelo custo do apagão que em 2009 deixou 18 estados sem luz.

Nove empresas receberam multas de R$ 61,9 milhões e recorreram. Ainda nenhum tostão saiu do caixa delas. Mas o distinto público que ficou sem luz pagará R$ 850 milhões a mais em suas contas em 2011.

O TCU informa que 32 obras de investimento do governo, 18 delas do PAC, deveriam ser paralisadas porque têm graves irregularidades e sobrepreço. Entre elas, algumas que foram exibidas na propaganda eleitoral da presidente eleita, como a Refinaria Abreu e Lima.

O financiamento do trem-bala não terá apenas dinheiro subsidiado, terá subsídio direto de R$ 5 bi nos primeiros anos. A lista das más notícias neste breve período pós-eleitoral é grande e está em várias áreas; em comum o fato de terem sido dadas em momento muito conveniente para o governo.

O governador do Rio, Sérgio Cabral, não pode alegar que desconhecia que o sistema de partilha, as mudanças na Lei do Petróleo e as condições da capitalização da Petrobras prejudicam frontalmente o estado que governa. Ele até chorou por isso, em público, meses antes das eleições. Depois, tratou a questão como resolvida.

O prejuízo teria sido evitado por um suposto e mal explicado acordo entre ele e seus aliados do governo Federal. A nova regulação do petróleo, que foi toda formatada no gabinete da então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff — hoje presidente eleita —, prejudica o Rio. O estado que produz 80% do petróleo que se extrai no Brasil e que será também grande no pré-sal perde porque no sistema de concessão o estado recebe royalties e participação especial.

No novo sistema não há participação especial e ainda há o risco de se perder grande parte dos royalties. Perde também porque a União fez a transferência para a Petrobras, na chamada cessão onerosa, de bilhões de barris de petróleo do pré-sal que também não pagarão participação especial ao Rio.

Disso tudo o governador Sérgio Cabral sabia antes e durante o processo eleitoral. Por que nunca disse isso ao eleitor? Por que deixa para entrar no Supremo Tribunal Federal depois das eleições? Um governador tem que ter como primeira lealdade a defesa dos interesses do estado que administra e não a coalizão política da qual participa.

O advogado-geral da União, Luís Adams, disse que vai contestar a Ação Direta de Inconstitucionalidade do Rio. "Não vejo futuro nessa Adin", disse Adams. Pois é. O que ela tem é passado: o tempo em que o governo do Rio esperou para entrar com a ação.

A declaração da presidente Dilma em sua primeira entrevista de que não poderia ignorar a pressão dos governadores pela CPMF — assim, docemente constrangida a defender o imposto — foi espantosa.

Primeiro, porque ela nunca deu ciência aos eleitores de que estava sendo pressionada; segundo, porque os governadores disputando eleição ou reeleição também não disseram que estavam pressionando quem quer que seja pelo imposto. Terceiro, porque a arrecadação aumentou depois do fim do imposto pelo peso da elevação de outros tributos.

O P da CPMF quer dizer provisório. Foi criada em momento específico e com objetivo limitado. Era para atravessar o período da transição entre a hiperinflação e a estabilidade, quando havia risco de uma queda da arrecadação. Ela cria muitas distorções. Parece prejudicar apenas quem faz transações bancárias mas afeta, em cascata, todos os preços da economia. Por ser cumulativa, vai produzindo um peso enorme sobre as empresas, que o transferem ao consumidor. Aí o imposto fica regressivo, injustamente distribuído.

Os governadores e os presidentes, eleita e em exercício, podem estar sinceramente convencidos de que sem a CPMF não é possível financiar a saúde — ainda que, como se sabe, ela pouco financiou a saúde — mas só poderiam tratar disso agora se tivessem defendido o imposto durante o processo eleitoral.

O Brasil tem um longo histórico de verdades ocultas durante o período em que encantadores candidatos tentam atrair o voto do cidadão pintando o mundo de cor-de-rosa e prometendo só alegrias. Por isso a CPMF é inaceitável. Só pode propor o imposto agora quem teve a coragem de defendê-lo quando estava no palanque.


Miriam Leitão